Ricardo Gondim.
Jesus de Nazaré, tu que és amigo dos pecadores, interceda por nós, os que perambulamos nas praias desertas sem esperar salvamento, os que varremos as pétalas que caíram durante a festa do casamento, os que tentamos nos lembrar do nome da antiga namorada, os que nos embriagamos com a aguardente dos nossos próprios discursos, os que nos esticamos para sair na fotografia do político de fala mansa.
Jesus de Nazaré, tu que és compassivo com a adúltera, interceda por nós, os que morremos de medo do sol e nos agasalhamos com os cobertores das noites sem lua, os que nos calamos com as certezas dos sábios e desdenhamos as dúvidas dos loucos, os que nos agachamos para não encarar a vida, os que desistimos dos nós cegos, dos torvelinhos e das palavras cruzadas, os que rimos de quem sonha voando, os que nos alimentamos de arroz requentado.
Jesus de Nazaré, tu que ouves o mendigo cego, interceda por nós, os que nos apressamos sem saber para quê, os que mantemos o gosto amargo do ódio, os que fazemos da justiça uma ameaça e do amor um suborno, os que cirandamos pelas coxias escuras do teatro em busca de um fantasma que nos seja solidário, os que bebemos a água da bacia de Pilatos.
Jesus de Nazaré, tu que és o Agnus Dei, interceda por nós, os que quebramos espelhos para não encarar os nossos monstros, os que cozemos disfarces coloridos, os que plastificamos sorrisos, os que temos ereção com o sangue da tragédia humana, os que nos betumamos com o pus dos africanos.
Jesus de Nazaré, tu que compreendeste a dúvida de Tomé, interceda por nós, os que tateamos as paredes úmidas dos corredores eclesiásticos, os que nos contentamos com os consolos da religião, os que adoramos ídolos de pés de barro e olhos de vidro, os que galgamos o pináculo da catedral para nos sentir divinos, os que não sabemos explicar o significado de simonia.
Jesus de Nazaré, que nos considera amigos, interceda por nós, os que nos dispersamos feito poeira no deserto, mas não desistimos de nossa petulância, os que nos apoiamos em hastes de trigo, os que velejamos em barcos de casco trincado, os que fabricamos relógios que andam para trás.
Jesus de Nazaré, que és eternamente bom, interceda por nós, os patéticos, os pusilânimes, os bufões, os desmiolados, os bárbaros, os relegados, os malbaratados, os palermas, os voláteis, os brutos.
Enfim, interceda por nós todos, porque ninguém é melhor do que ninguém e, juntos, somos os teus filhos.
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